
Há alguns dias, respondi a umas postagens do blog do Greyiscown (esse aqui) que propunham que nós visitantes indicássemos três das melhores entidades (heróis, vilões, livros, filmes...) de acordo com nossa opinião. Eram onze categorias. Um pouco cansativo, mas bem interessante: lembrar de pelo menos trinta e três de suas melhores vivências. Isso me fez recordar de duas coisas. Primeiro, de um filme (High Fidelity, de 2000, traduzido sob o título de Alta fidelidade) onde o protagonista conversa conosco expondo as cinco experiências mais intensas em cada tema que ele julgava relevante no momento. O filme resultou para mim em uma viagem por minhas próprias recordações. Finalmente, lá pelas tantas, no meio das respostas que dava às postagens do Greyiscown, recordei-me de uma coisa comum ao que me aconteceu tanto ao assistir High Fidelity, quanto ao ir respondendo às categorias indicadas no blog. Trata-se da ação proposta pela frase misteriosa — afinal, falar qualquer coisa, como "vá comprar pão", em latim, acaba soando como um encantamento de magias ocultas — que dá título a estas palavras: conhecer-se a si mesmo.
Quando vejo à minha frente um grande número de melhores acontecimentos — e acredito que algo semelhante poderia vir dos piores — de minha vida, enumerados por mim mesmo e a respeito dos quais nem pensava em muito tempo, acabo espantando-me com um surto de novidades que descubro ao olhar para o lugar em que menos esperamos encontrar novidades: o passado. Há quem diga que só precisamos do tempo presente para nos autocompreendermos. E também há quem diga que esse negócio de "conhecer-se" não dá nenhum futuro. Prefiro considerar meu tempo como um todo, sem desprezar nenhuma de suas partes. Planejar o resgate de boas coisas velhas no futuro, tirar novidades do passado, viver mais uma vez um mesmo presente que valha a pena...
Isso me fez ver o quanto ainda negligencio um tanto importante de componentes fundamentais de minha vida, e o bom tanto de estrada que ainda falta percorrer para me encontrar. Não lembro agora qual poeta, nem as palavras exatas, mas ele dizia que encontrar-se é perder-se. E que perder-se é encontrar-se. E que então vale mais procurar-se, porque se você acha que se encontrou, então está perdido... e se você está perdido, precisa se encontrar.
Minha vida é uma sucessão infinita de aventuras e desastres. Eu ando, sem qualquer habilidade, na tênue corda bamba chamada "por-um-triz". Sempre acho que me falta sensatez, que as coisas podem ser diferentes, que eu poderia ter agido melhor, que o próximo ano pode ser mais organizado, e assim por diante. Todas as coisas que conquistei fazem parte de mim, mas a soma delas não me equivale, o valor delas, qualquer que seja, pode mudar, cair por terra... pois elas não dependem só de mim, estão fora da parte de mim em que posso me permitir a ilusão de controle. Sou controlado por mim mesmo, mas eu mesmo sou uma força que desconheço — ou que, na melhor das hipóteses, conheço apenas parcialmente.
Aos meus dezessete anos, eu nunca beberia cachaça, nunca encheria a cara de cerveja, jamais fumaria absolutamente nada, sempre amaria profundamente todas as mulheres que beijasse, faria a autoanálise de minhas ações em todas as noites, antes de dormir, e me tornaria um escritor. Nos dez anos que se seguiram, apenas algumas decisões permaneceram. Perdi boa parte de minha maturidade (eu era mais velho quando mais novo), ganhei cicatrizes — e parafusos de metal no osso, apesar de ter perdido uns parafusos da cabeça —, vivi um bocado de coisas que não pretendo repetir e outras que quero sempre fazer denovo, lamentei por um bisavô e por um grande amigo em potencial, e realizei a primeira autêntica 'road trip' entre amigos.
Continuo completamente perdido, mas, como dizia o poeta, o importante é procurar-se.