quinta-feira, fevereiro 18, 2010

Abortem a realidade!


No meu trabalho tenho contato com algumas situações delicadas. Desde uma pessoa com AIDS, que talvez possa ser um conhecido, até uma criança que nasceu morta ou morreu pouco depois de nascer devido a "mãe" ter tentado aborto.

Comecemos pelo último caso que citei. Uma jovem de 23 anos, estudante, quase certo que seja uma univesitária patrocinada pelos pais que moram no interior ou em outro estado, moradora de um bairro de classe média-alta. Difícil não fazer pré julgamentos, mas espera-se que seja uma pessoa que tenha um pouco mais de conhecimento e nível cultural. Engravidou. Não sei em que momento, tentou aborto com Citotec. A criança nasceu com inúmeras deficiências e complicações, as piores possíveis, e morreu pouco depois. Aqui tem mais informações sobre o Citotec, ou Cytotec.

Não vou entrar mais a fundo na questão do aborto. Meu posicionamento é a favor da descriminalização, mas apenas acompanhada de muita informação. É preciso educar o povo antes de "oferecer" o direito de fazer uma escolha como essa. Enfim, o que penso sobre o caso é que tudo poderia ter sido evitado. Claro que acidentes podem acontecer. Mas, infelizmente, creio que a "mãe" pensou apenas em si mesma a maior parte do tempo. Não excluo também a culpa do "pai".

Vamos aos outros dois casos que me deixaram perplexo: uma criança recém nascida que morreu devido a complicações causadas pela candidíase contraída pela "mãe" durante ou antes da gravidez, que acabou evoluindo para uma infecção que passou para a criança. A infecção matou o bebê. Candidiase é uma doença muito simples de se identificar e tratar. Outra criança recém nascida, acometida por escabiose. Fica até menos impressionante dizer que foi a escabiose que matou a criança. Aos leigos (assim como eu), escabiose é a popular sarna. SARNA!? Pode uma coisa dessas??? Eu nem imaginava que era possível morrer por causa de sarna!!

Contrapondo ao primeiro caso, esses dois últimos ocorreram em áreas de classe (muito) baixa. Sem pré julgamentos aqui também. Isso poderia ter ocorrido em outros níveis da sociedade. Mas o fato é que não ocorreram. O que, provavelmente, colaborou para que ambos os casos acontecessem foi a falta de informação e educação das mais básicas. Não acredito que tenham sido apenas situações de descaso. Me recuso! A verdade é que eram duas mulheres que certamente não tiveram acesso a educação e tampouco aos serviços de saúde, seja por total ignorância e desconhecimento de seus direitos ou pela falta de acesso aos mesmos.

Partindo de todos os casos, poderíamos iniciar discussões que passariam por valores, moral, ética, política, educação, direitos, capitalismo, lucro e nem sei mais o quê. Uma diversidade de fatores podem colaborar para que os três casos ocorram. Mas eu gostaria de destacar valores e educação. Ambos faltaram completamente. Seja a educação que deveria ser garantida pelo Estado a todo cidadão ou os valores que são passados pelos pais, que são parte importante da educação e da formação de cada indivíduo. É muito difícil falar sobre isso sem cometer o erro de ser preconceituoso ou conservador, ou as duas coisas ao mesmo tempo. Mas talvez eu seja mesmo, admito.

Apenas saber sobre esses três casos me abalou profundamente. E isso porque eu apenas li sobre eles! Não cheguei nem perto nem soube nada de qualquer pessoa envolvida. Estou supondo muita coisa. Mas o mais triste é saber que qualquer suposição, por pior que seja, é sempre muito próxima da realidade. E quando partimos para a realidade, nos deparamos com um sem número de situações iguais ou piores. Chega a ser desesperador.

Eu só consigo pensar em uma pergunta:

Esse é o mundo que estamos criando?



PS: A pergunta é similar ao título de uma música maravilhosa, e triste, do Queen: Is This The World We Created.

Aqui está um vídeo da música tocada ao vivo e com a tradução em português.




Se falhar o vídeo no post, aqui está o link: http://www.youtube.com/watch?v=IorxEFvGZYM

PS2: Sim. Ando meio deprimido. Essas coisas me afetam muito. E olha que pretendo ser Assistente Social...

PS3: Me parece que o governo evita citar o uso do Citotec até mesmo para esclarecer sobre os malefícios causados. Creio eu que seja para não incentivar/popularisar ainda mais o seu uso para o aborto. Não encontrei muita coisa sobre o remédio a não ser diversos sites oferecendo-o ou mulheres querendo saber como consegui-lo. Basta pesquisar no Google. É muito triste...

PS4: Nossa amiga médica (ou os demais também) pode me corrigir se eu tiver falado bobagem em qualquer parte do texto.

6 comentários:

  1. É. Não consegui colocar o vídeo. Se alguém souber e puder me ajudar, agradeço! Grande abraço a tod@s!

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  2. Concordo um bom tanto com os pontos que você mais defendeu. Educação, valores e discriminalização do aborto. Isto soa o jargão político mais velho, e talvez o menos implementado, mas todos sabemos que educação está entre os ideais mais fundamentais pra fazer as coisas darem certo. Os valores não devem vir de outro lugar senão de uma boa educação. Mesmo bons valores religiosos ficam deslocados e esdrúxulos quando não balizados por uma boa formação que inclui a crítica a eles. Pessoas bem educadas, num sentido amplo, conseguem discutir e tratar efetivamente dessas coisas (seja aborto, pena capital, privatização, ou o diabo), sem atirarem pedras umas nas outras e, na maior parte das vezes, gerando bons novos ensinamentos sobre o assunto. Não vi de perto nenhum desses casos, mas apesar de tudo, acredito que defenderia a decisão da suposta universitária, mesmo que se confirmasse que ela estivesse pensando apenas em si mesma. Sei que cometo alguma injustiça ao pensar assim, mas que mãe ela seria nesse estado? A resposta é um mistério, porque as coisas por vezes surpreendem, e é nisso que consiste a injustiça de minha posição, mas acho que a boa educação dos nossos pesquisadores engendrou a possibilidade de escolhermos até mesmo se uma gravidez vai a frente ou não (e vamos continuar lidando com mais coisas possíveis de se fazer, que vão gerar mais dúvidas e problemas), de modo que temos que lidar com mais esse poder e decidir o que fazer com ele. Ela fez um mal ou um bem? Que valor eu posso usar pra julgar isso? Que direito eu tenho de julgar isso?
    Os outros dois casos pareceram mais aquelas coisas que só poderiam ser evitadas muito antes, se muitas coisas tivessem acontecido diferente (uma boa educação, por exemplo, coisa que parece não ter ocorrido). Eles me fizeram pensar "Que direito eu tenho de não estar preparado quando algo ruim acontecer?", e admito que é um pensamento assustador. Será que eu mesmo estou livre de descuidos que me levem a, por exemplo, germinar alguma doença estúpida que prejudique um tanto de gente?

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  3. Meus maiores traumas de faculdade estão ligados a esse tipo de coisa. Concordo com o Bogodes, muito provavelmente eu ficaria do lado da moça que abortou, acho que o aborto tem que ser um direito da mulher e que se ela estivesse adequadamente informada sobre como fazê-lo teria dado certo.
    É importante a informação quanto ao sexo, o uso de contraceptivos, a contracepção de emergência e o aborto CASO ESSAS COISAS FALHEM.
    Outra possibilidade: a menina no maior love com o cidadão, um belo dia ele a espanca e ela, sabiamente, termina o relacionamento. Infelizmente, começam os enjoos, a fraqueza e ela descobre que está grávida do marmanjão violento!
    Não, pela lei, ela NÃO PODE abortar, uma vez que não foi estupro e não há risco de morte.
    A coitada (literalmente) fica condenada a carregar, gerar e criar um filho de uma relação decepcionante.
    Aborto, camisinha, pílula, DIU, até a abstinência são direitos da mulher!

    Quanto às outras histórias, vou confessar que acho que me parecem, da visão médica, incompletas.
    Até admito que se possa fazer uma septicemia por sarna, mas candidíase acho bem difícil...

    Eu tinha mais algumas coisas pra contar, mas isso é um comentário e não um post, já está comprido demais.

    Beijoka

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  4. E o prêmio pleonasmo 2010 vai para: GENZA, com ACHO QUE ME PARECEM!!

    \0/

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  5. Obrigado pelos comentários e em especial pela colaboração técnica da Genza!

    Concordo com os dois quanto a questão do aborto. Eu sabia que aquele trecho não deixou bem claro a minha opinião. A minha birra nesse caso, foi como a Genza citou, "se ela estivesse adequadamente informada sobre como fazê-lo teria dado certo". Se vai fazer algo dessa magnitude, procure melhor pelas informações.

    Bogodelhos, como bom filósofo que vc é, me colocou a pensar por horas quando fez a pergunta "Que direito eu tenho de não estar preparado quando algo ruim acontecer?". Eu gostaria que vc escrevesse algo a respeito disso. Vou pensar em algo também.

    Parabéns a Genza pelo prêmio auto-concedido! =P

    Beijo e abraço!

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  6. Ótimo texto...!
    Li o link sobre o Cytotec e me emocionei! (gay! eu sei!).
    Quanto a discussão iniciada pelo Bogodes e sei que logo mais será apontada pela Gorda (sei que ela vai apoiá-lo em vários pontos), a frase "Que direito eu tenho de não estar preparado quando algo de ruim acontecer?" é foda e exprime o medo que temos de não dominarmos "TODO" o conhecimento sobre "TUDO" o que é necessário para uma vida saudável. Entretanto, penso que não há razões para pensar nisso, pois pessoas como você (Bogodes) costumam buscar o conhecimento, e sabem que qualquer mudança no corpo, por mais simples que seja, deveria ser acompanhada de um médico. Se você perceber alguma alteração (cor, cheiro, tamanho, etc.) então deve procurar orientação médica. Não queria desviar o assunto, mas achei necessário. Outra observação que considero importante (um ciclo vicioso, que parece eterno): enquanto nossos legisladores (brasileiros) estiverem pensando em votos e nossa sociedade for baseada no cristianismo, acho difícil que a lógica será quebrada: abortos debatidos para então serem legalizados e uma sociedade com uma boa educação. Apesar da minha posição ser contra, acho que essa decisão cabe a apenas a mãe.
    P.S.: Acho que essa onda crescente de "Evangélicos" ainda pode vir a se tornar a razão de um futuro colapso da sociedade. Mas essa é outra discussão.
    Retornando ao Bogodes: Quando você se refere a "pessoas bem educadas", você esquece que elas ainda são uma minoria ridícula nesse nosso país.
    Ainda viveremos sob esta realidade aí, exibida pelo Lannart por várias gerações e eu torço que não seja por muitas. Acho válida nossa discussão por: 1-Além de nos enriquecer de conhecimento; 2-Aumenta e/ou melhora nossos argumentos para outros debates futuros com pessoas que ainda sequer pensam nesses assuntos (ou em outros mesmo!) e 3-Ajudam a conhecermos-nos mais e mais.
    Agradeço pela boa leitura e a discussão aqui apontada!!
    Abraços!

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